Paulo Roberto Soares: Pai de João Roberto

Cabe à PM punir o que a própria sociedade decidiu não punir?

Creio que todos se lembram do caso escabroso do garoto João Roberto. Definitivamente não relembrarei os detalhes do caso. Realmente acredito que você leitor ainda se recorde, e ainda, em meu estado gravídico e vivendo no Rio de Janeiro ME RECUSO a visualizar tal tipo de atrocidade.

No dia 10 de dezembro de 2008, depois de 13 horas de julgamento, um dos policiais envolvidos, o cabo Willian de Paula, foi ABSOLVIDO pelo Tribunal do Juri do Rio de Janeiro. Cerca de trinta dias depois, o Conselho de Disciplina da PM decidiu pela sua expulsão da Corporação.

Agora veja você, caro leitor: o cabo Willian foi pronunciado por homicídio doloso duplamente qualificado e duas tentativas de homicídio. Segundo o entendimento do Tribunal do Juri, que é composto por sete cidadãos comuns, o cabo cometeu sim homicídio doloso porém o fez no estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito. Em outras palavras, para a sociedade, representada pelos sete jurados, o policial estava cumprindo o seu dever quando matou uma criança de 3 anos de idade! Pergunto: desde quando o dever de um policial é metralhar um carro ocupado por uma mãe e seus filhos?

Não vou destrinchar a sentença em artigos e minúcias. Quem tiver interesse em ler que leia a íntegra no final do artigo. Pouparei os leigos em direito, dando apenas o resumo da ópera: o cabo Willian foi apenas condenado por lesões corporais, a uma pena de 7 (sete) meses de detenção com direito - claro - a sursis. Em outras palavras: sem cadeia para ele.

Mas a PM resolveu não deixar por isso mesmo! O Governador Sérgio Cabral já havia dito no dia seguinte ao julgamento do policial:

“Espero que a PM puna. Ele (William) não serve para ser policial militar, nem para o serviço administrativo. Tem que ser afastado. Não tem proteção para uma atitude como essa”.

O que o senhor Governador se esquece é que dificilmente essa decisão administrativa será mantida, se questionada na Justiça. A sociedade entendeu que o cabo William, ao matar a criança, estava no cumprimento de seu dever como policial e portanto nada deve ao Estado ou à sociedade. Qual seria o motivo para a Corporação decidir pela sua expulsão? Como a sociedade mesmo decidiu: ele estava cumprindo o seu dever, oras bolas!

Não me entendam mal, leitores! Mas foi a decisão da sociedade! Isso apenas prova que enquanto muitos descem o malho nas leis, nos julgadores e nos Tribunais, a sociedade não fica nada atrás. Quando cabe a ela decidir, ela faz essa "caca" que vocês podem ler abaixo! Absolvem um policial que, sem pensar duas vezes, metralhou um carro com uma mãe e dois filhos dentro!

Chora Paulo! Pode chorar com vontade! Você perdeu um filho e viu com repulsa a sociedade dizer que a morte do seu filho de 3 anos foi "estrito cumprimento do dever legal". Não se iluda com a decisão da PM em expulsar o cabo. Caso ele conteste a decisão administrativa na Justiça, escreva o que te digo, ele voltará à corporação pois essa decisão será ANULADA e ele será REINTEGRADO.

Claro que tudo depende de quanto o cabo William vai querer economizar na hora de contratar o seu advogado.

Quem tiver a curiosidade de ler a M*** de sentença, segue abaixo a prova da leniência de nossa sociedade, que não perde em nada para nossos juízes, desembargadores e políticos!
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Processo nº: 2008.001.175520-3
Movimento: 136
Tipo do Movimento: Sentença

Vistos etc. Trata-se de ação penal proposta pelo Ministério Público em face de WILLIAM DE PAULA, devidamente qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos III e IV (uma vez) e art. 121, § 2º, incisos III e IV c/c art. 14, II (duas vezes), na forma do art. 70 c/c art. 29, na forma do art. § 3º do art. 20, todos do Código Penal. O réu foi pronunciado às fls. 704/714.

As partes se manifestaram nos termos do art. 422 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.689/2008, às fls. 733 e 736, respectivamente, tendo o Ministério Público arrolado testemunhas e requerido diligências, enquanto a Defesa apenas apresentou rol de testemunhas.

Através do despacho de fls. 741 foram deferidas as diligências requeridas pelo Ministério Público e a inquirição das testemunhas arroladas pelas partes. Às fls. 742/747 está o relatório de que trata o art. 423, II, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.689/08, que adoto. Nesta data, o processo foi incluído em pauta e o réu foi submetida a julgamento pelo Tribunal do Júri, conforme termos da respectiva ata. Reunidos na sala secreta, os jurados responderam aos quesitos que lhes foram apresentados para votação pelo Juiz Presidente. É O RELATÓRIO.

Após regular votação, o Conselho de Sentença assim decidiu: Em relação ao crime de homicídio doloso duplamente qualificado em face da vítima João Roberto Amorim Soares, o Conselho de Sentença, respondendo a primeira série de quesitação, respondeu afirmativamente aos primeiro e segundo quesitos, reconhecendo a materialidade delitiva e a autoria imputada ao réu, bem como respondeu negativamente ao terceiro quesito, reconhecendo não ter o réu agido culposamente, mas com dolo.
 
Todavia, ao responder afirmativamente ao quarto quesito da primeira série, o Conselho de Sentença absolveu o acusado WILLIAM DE PAULA do crime de homicídio consumado a ele imputado, acolhendo a tese defensiva de estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito, restando os demais quesitos da referida série prejudicados.

No tocante aos crimes de homicídios tentados, duplamente qualificados, o Conselho de Sentença respondendo afirmativamente os primeiro e segundo quesitos das 2ª e 3ª séries, reconheceu a materialidade delitiva e a autoria, de ambos os delitos, imputada ao réu. Contudo, o Conselho de Sentença respondeu negativamente os terceiros quesitos das 2ª e 3ª séries de quesitação, desclassificando os fatos para infrações, em tese de lesão corporal, que não se inserem na competência do Tribunal do Júri, cabendo a este Juiz Presidente proferir a sentença nos termos do art. 492, § 2º, do Código de Processo Penal. Ocorre que, que a desclassificação operada pelo Júri tipifica os fatos praticados pelo réu em detrimento das vítimas Alessandra e Vinícius, em tese, no crime de lesão corporal previsto no art. 129, caput, do Código Penal, considerado de menor potencial ofensivo, razão pela qual foi dada oportunidade ao Assistente de Acusação para se manifestar sobre eventual composição civil e ao Ministério Público para oferecimento de transação penal e de suspensão condicional do processo, tudo nos termos do § 1º do art. 492 do Código de Processo Penal, não tendo, entretanto, havido possibilidade de conciliação nem tampouco sido oferecida proposta de transação ou de sursis processual por parte do Dr. Promotor de Justiça, conforme consta da assentada.

Prosseguindo, então, na decisão referente aos crimes de lesão corporal leve, verifico que a materialidade de ambos os delitos se encontram comprovadas nos autos, respectivamente, pelo Auto de Exame de Lesão Corporal de fls. 321/322 realizado na vítima Alessandra e pelo Relatório de Atendimento Médico da vítima Vinícius de Amorim Soares acostado às fls. 448.

Quanto à autoria, a prova revela que o réu William de Paula efetuou disparos em direção ao veículo em que se encontravam as vítimas Alessandra e Vinícius no dia dos fatos, os quais provocaram a quebra dos vidros do veículo, lesionando Alessandra com estilhaços ao mesmo tempo em que provocaram lesão no ouvido de Vinícius pelo forte barulho provocado pelos disparos e também pela queda dos vidros.

Basta ver que o próprio acusado não nega que era um dos ocupantes da viatura policial que abordou de forma totalmente inadequada o veículo em que se encontravam as vítimas, sendo que na ocasião o carro foi atingido por pelo menos dezessete disparos de arma de fogo, inclusive de fuzil - este portado por William -, conforme atesta a prova técnica-pericial de fls. 130/139. Por outro lado, em seus depoimentos judiciais, Alessandra não teve dúvida em reconhecer o acusado William como a pessoa que no dia dos fatos se aproximou do veículo com um fuzil nas mãos, ordenando-lhe que deixasse o carro e perguntando ainda sobre indivíduos que equivocamente supunha estar no automóvel das vítimas.

Note-se que a vítima Alessandra, além de descrever o fato com extrema precisão e riqueza de detalhes, apresentou versão inteiramente compatível e harmônica com as demais provas, oral e pericial, produzidas nos autos, merecendo sua palavra total credibilidade, inclusive na participação do réu William no evento, na condição de autor.

Em sendo assim, forçoso é convir que a prova dos autos é suficiente para a prolação de um decreto condenatório em desfavor do réu William pela prática dos crimes de lesão corporal praticada em desfavor das vítimas Alessandra e Vinicius.

Isto posto, considerando a decisão soberana do Egrégio Conselho de Sentença, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão punitiva estatal em relação ao crime de homicídio consumado, duplamente qualificado, em figura como vítima JOÃO ROBERTO AMORIM SOARES e, por via de conseqüência, ABSOLVO o acusado WILLIAM DE PAULA, brasileiro, RG 09.711.095-1 IFP, nascido em 13.07.71, filho de Hélio de Paula e Marli de Oliveira de Paula, da prática do crime do art. 121, § 2º, incisos III e IV, do Código Penal, o que faço com fulcro no que dispõe o art. 386, VI, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.690/08.

Outrossim, considerando também a desclassificação operada pelo Conselho de Sentença e a fundamentação acima exposta, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal e CONDENO o acusado WILIAM DE PAULA como incurso na pena do art. 129, caput, duas vezes, na forma dos arts. 29 e 70, 1ª parte, do Código Penal.

Passo a fixação da pena em relação aos delitos de lesão corporal, observando o disposto no artigo 59 do Código Penal. Não obstante ser o réu primário, de bons antecedentes e boa conduta social, agiu com extremada culpabilidade e acentuada reprovabilidade comportamental, pois não se preocupou em adotar as cautelas exigíveis na abordagem feita ao veículo das vítimas, nem tampouco com as pessoas que poderiam ser atingidas no evento.

Ademais, os motivos do cometimento do delito também não lhe são favoráveis nem tampouco as circunstâncias dos crimes e muito menos as suas conseqüências, porquanto nada justifica tamanha e desproporcional agressividade e os meios utilizados para a realização do delito, especialmente no uso de armamento de alto poder destrutivo, sendo certo que foram enormes as seqüelas deixadas nas vítimas e em seus familiares e até hoje não lograram se recuperar da tragédia que se viram envolvidos de forma surpreendente e inusitada.
 
Em sendo assim, por entender que as circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu são preponderantes na hipótese sub judice, fixo a pena-base de um dos delitos, por serem de igual gravidade, acima do mínimo legal, ou seja, em 06 (seis) meses de detenção, aumentando-a de 1/6 (um sexto) por força do concurso formal, tornando-a definitiva em 07 (sete) meses de detenção, ante a ausência de outras causas modificadoras.

O regime inicial para o cumprimento da pena será o aberto, nos termos do art. 33, §2º, alínea ´c´, do Diploma Repressivo. Condeno o réu, ainda, ao pagamento das custas processuais, diante de sua sucumbência neste feito e em cumprimento ao que determina o art. 804 do Código de Processo Penal.

Por fim, não estando presente o requisito do artigo 44, inciso I, do Código Penal, ante a violência em que foram cometidos os crimes, deixo de substituir a pena privativa de liberdade aplicada por pena restritiva de direitos. Em se tratando de direito subjetivo público do réu e preenchendo ele os requisitos para a sua obtenção, concedo-lhe a suspensão condicional da execução da pena pelo prazo de 02 (dois) anos, devendo para tanto observar as condições previstas no art. 78, § 2º, alíneas b e c, do Código Penal, e ainda durante o primeiro ano do período de prova, nos moldes do art. 78, § 1º, do aludido diploma legal, prestar serviços à comunidade, pelo período de 07 (sete) horas semanais, em instituição a ser indicada pelo Juízo da execução.

Expeça-se alvará de soltura, se por al não estiver preso. Transitada em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados, expedindo-se Carta de Sentença à Vara de Execuções Penais e promovendo-se as devidas anotações e comunicações.

Publicada em Plenário do II Tribunal Popular e intimadas as partes presentes, registre-se.

Sala das Sessões do II Tribunal do Júri da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, às 23:40 horas do dia 10 de dezembro de 2008.