Pensão de 15k?  Está bom ou quer mais?

Não vou entrar no mérito do caso concreto, pois se o Tribunal de Justiça entendeu que o cidadão tinha capacidade financeira para arcar com tal encargo e que o padrão da ex deveria ser mantido, quem sou eu para discordar?

Mas quando o assunto é prisão civil, é preciso uma ponderação mais detida sobre os verdadeiros fundamentos para a fixação da pensão alimentícia. 

Não é raro a fixação de pensão alimentícia em patamares mais elevados para se manter o padrão de vida do/a ex.  

Mas a pergunta que foi respondida pela Quarta Turma do STJ é:  pode a prisão civil se aplicar a todo e qualquer tipo de inadimplemento?  Ou o julgador deveria levar em consideração a finalidade para a qual foi fixada?

No caso concreto, o cidadão havia sido condenado ao pagamento de 5 salários mínimos em primeira instância.  O TJ (instância acima) aumentou a pensão para 15 salários mínimos sob o fundamento de que deveria ser mantido o seu padrão de vida da ex companheira, que por 20 anos havia se dedicado a cuidar da família sem desenvolver atividade profissional. 

Como já era de se imaginar, o ex não conseguiu honrar com essa pensão polpuda para a ex-mulher e ela entrou com cumprimento de sentença pedindo o pagamento de uma pensão acumulada de R$ 35,4 mil  sob pena de prisão. Em vista disso o ex companheiro impetrou Habeas Corpus para evitar o xilindró. 

A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça então concedeu um salvo-conduto para evitar a prisão do empresário que hoje tem 83 anos.

Quando olhamos a primeira vista, a tendência é pensarmos:  mas ela se dedicou 20 anos ao marido e família sem trabalhar e a prisão é a única arma  para se forçar o pagamento da pensão alimentícia.  Olha o STJ fazendo caca!

Calma.  É ai que o conhecimento do caso concreto entra na jogada e as discussões de internet se perdem no vazio de seus julgamentos leigos.  

O valor fixado inicialmente foi de 5 salários e foi pago regularmente por NOVE ANOS.  Foi só ao final desse período que o TJSP julgou o recurso de apelação aumentando a pensão para 15 salários.  Em outras palavras, durante NOVE anos a ex companheira viveu - e bem - com os 5 salários mínimos.  

Ora se o aumento da pensão foi para manutenção do 'padrão de vida' da ex companheira, evidentemente que não se tratava de verba para garantir a sobrevivência dela.  Aliás, por NOVE ANOS ela sobreviveu com 5 salários-mínimos.

E foi nesse contexto que o Ministro Raul Araújo analisou o caso e entendeu que a prisão, de fato, não é cabível. Essa medida só se justifica quando o pagamento da pensão foi imprescindível para a sobrevivência do alimentando.  No caso a se destinou a compensar a drástica queda do padrão de vida da ex-companheira, após o término do relacionamento e portanto não tem natureza propriamente alimentar, mas indenizatória:

"Nos termos do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal, somente quando houver o inadimplemento inescusável e voluntário por parte do responsável pelo pagamento de prestação alimentícia, afigura-se possível e cabível a sua prisão civil (art. 5º, LXVII, da CF).

 Isso, porque a prisão por dívida de alimentos é medida drástica e excepcional, que somente é admitida excepcionalmente, quando imprescindível à subsistência do alimentando, não estando atrelada a uma possível punição por inadimplemento, ou mesmo à forma de remição da dívida alimentar, tendo como escopo coagir o devedor a pagar os alimentos devidos a fim de preservar a sobrevivência do alimentando." 

E concluiu o Relator: 

Diante das circunstâncias fáticas do presente caso, vislumbra-se a ilegitimidade da coação civil extrema, uma vez que os valores devidos não consubstanciam necessário risco alimentar para a credora, nem se constata o caráter inescusável da dívida alimentar, que são elementos imprescindíveis para a legitimidade da prisão civil", concluiu o relator. 


Decisão bem embasada. E antes que qualquer leitora/leitor me jogue pedras por concordar plenamente com o STJ, lembramos que ela ainda pode cobrar a pensão alimentícia devida, valendo-se do rito normal da execução, com penhora, bloqueios, e o escambal.  

Apenas não poderá colocar o ex companheiro de 84 anos na cadeia. 

 A votação foi unânime.

HC 744.673
Leia a íntegra AQUI